Folha de São Paulo
- 07/03/2005
Música – "Antologia da Canção Brasileira",
com Léa Freire, é marca na carreira de instrumentista, que lança projeto funk

Por Ronaldo Evangelista

CD de Bocato traz o trombone à história do jazz brasileiro.

Figura cult, pouco conhecido do público em geral, o trombonista Bocato é hoje um dos mais expressivos instrumentistas brasileiro. Representante típico da grande mistura que é a nossa música, Bocato se sente à vontade tocando - e toca, incansavelmente - jazz, samba, rock, funk, rap.
Topa tudo. Faz parte da banda que acompanha cantores como Felipe Dylon no "Domingo do Faustão". Participa como músico e arranjador de discos e shows de Marcelo D2, Seu Jorge, RPM, Maria Rita, Noite Ilustrada. Comanda uma big band dançante em baladas de São Paulo.
Depois de anos à frente da Jam Suburbana, banda tradicional da noite paulistana, o músico agora lidera projeto novo, Bocato toca funk, que estreia temporada hoje no Armazem da Vila (r. Beira Rio, 116, SP, tel. 0/xx/3045-3573). Formada por mais de dez músicos (incluindo naipe de sopros, coro vocal e um dançarino que parece saído de um filme dos anos 70), a banda toca de Prince a James Brown, passando por Tim Maia e Jorge Bem. "Adoro fazer as pessoas dançarem, Essa é uma das funções mais nobres da música, animar o pessoal. E o que eu quero é fazer isso com leveza, com beleza, quero uma animação de alto nível", diz.
Bocato também lança agora, em parceria com a flautista Léa Freire o excepcional "Antologia da Canção Brasileira", pela gravadora Maritaca. Com arranjos de Léa, outro enorme baluarte do instrumental nacional, o disco sai dividido em dois volumes, um lançado neste começo de ano e outro por vir no segundo semestre. Com interpretações sensíveis, de tirar o fôlego, de canções como "Boa Noite, Amor" de José Maria de Abreu, "Folha Morta", de Ary Barroso, entre outras, "Antologia" é o melhor CD da carreira de ambos e um dos mais relevantes discos da história do jazz nacionalrecente.
"A idéia para esse CD nasceu inspirada em músicos como Chet Baker, mas principalmente naquele clássico álbum de baladas do John Coltrane. Percebi que nunca havia sido feito no Brasil um disco como esse, só de interpretações lentas de canções brasileiras. Convidei a Léa para o projeto, e ela escreveu esses arranjos geniais, eternizou as harmonias de todas essas músicas", diz.
"Curioso é que agente se conhece a mais de 20 anos, mas nunca haviamos gravado um disco. Ela sempre foi fiel ao lado instrumental da música. Tenho esse amor por muitas coisas diferentes."
Nas lojas já há alguns meses, há ainda o álbum "Cacique Cantareira", lançado pela gravadora independente Elo Music dentro da série CD7, que já tem álbuns de Itamar Assumpção e Naná Vasconcelos, sempre tocando sete músicas. Aqui, Bocato retoma o estilo de discos anteriores: "acid samba" - termo que inventou para definir seu samba-jazz dançante, sua mistura de música brasileira, improvisação e funk modernizado. Há samba à Miles Davis, e há declaração de amor a Beethovenn levada pela percussão.
Com mais de 20 anos de experiência, Bocato tem história pra contar. Começou tocando ainda adolescente, no ABC. Fazia shows e discos com sua banda Metalurgia e em pouco tempo virou músico "gente grande": aos 19 anos entrou para a banda de Elis Regina. Seguiram-se shows e discos com Roberto Carlos, Rita Lee, Arrigo Barnabé e Hermeto Pascoal.
Depois lançou vários álbuns solo e atravessou o final dos anos 80 como um maldito, rebelde, vivendo a vida louca, até se recuperar em meados dos 90. Gravou então seis discos com o conjunto Art Popular ("uma suingueira do caramba!"), tocou em festivais e gravou CDs na Europa, lançou um elogiado álbum com interpretações de Pixinguinha...
Atualmente, derrete-se por uma cantora chamada Aretha Marcos, que está produzindo. Filha dos cantores Antônio Marcos e Vanusa, Aretha era a garota de seis anos que, nos anos 80, estrelava especiais da Globo como "Arca de Noé" e "Plunct Plact Zuuum". "Ela me lembra a Elis, que eu via chorando de emoção enquanto cantava e não entendia. Agora vejo a Aretha, é igual. Ela não canta, ela interpreta. Ela chora e faz a banda inteira chorar."

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