Revista Modern Drummer
Velocidade e Musicalidade
por:
André Carvalho
fotos:
Dani Gurgel
Agosto 2006 - Ano 4, nº 45

Edu Ribeiro - Revista Modern Drummer
Edu Ribeiro é um baterista natural, daqueles que nasceram com o ritmo nas veias. Seu gosto pela música brasileira, a facilidade de tocar samba e as velocidades que alcança sem perder a musicalidade impressionam qualquer um.
O início de seus estudos aconteceu de forma autodidata, e logo ganhou espaço para tocar no conjunto de bailes de sua família, o Stagium 10. O próximo passo foi a faculdade de Música Popular da Unicamp (SP), onde ele desenvolveu sua técnica, conhecimentos profundos sobre a música brasileira e começou a atuar no meio instrumental. Nessa época, seu grupo Água, com Chico Saraiva e José Nigro, foi um dos selecionados para o projeto "O Som da Demo", promovido pelo Sesc.
Em 1996, Edu mudou-se para São Paulo e o envolvimento com a música instrumental não parou mais. Nasceu uma grande parceria com Chico Pinheiro e seu trabalho ganhou personalidade e força. Depois de lançar os álbuns Corrente (com Paulo Paulelli e Fábio Torres, 2005), agora ele lança seu primeiro álbum solo, Já to Te Esperando, no qual explora sua faceta de compositor.


MD: Você está lançando o álbum Já to Te Esperando. Por que fazer um álbum solo?
Edu: Não penso muito em um motivo para fazer os discos, apenas quero registrar e dividir com as pessoas um momento musical que estou vivendo. A novidade é que neste álbum estou registrando o meu trabalho também como compositor. Já havia lançado dois CDs, Corrente (Maritaca) e Horizonte (Trama/Mix House), e mostra apenas meu trabalho como baterista. Nunca havia registrado minhas músicas nesses discos.

MD: Alguma música do álbum foi composta à bateria?
Edu: Componho tudo no violão. Algumas coisas me vêm à cabeça enquanto estou tocando bateria e aí corro para o violão e escrevo melodia e harmonia. Algumas músicas me remetem imediatamente a certas levadas de bateria e em outras tenho de procurar o que tocar depois de prontas.

MD: Por todo o trabalho nota-se seu controle e velocidade sobre a bateria. As músicas "Já Tô Te Esperando" e "Cebola no Frevo" têm levadas muito rápidas.
Edu: A música "Já Tô Te Esperando" é um chamamé (ritmo do sul) muito rápido, o que pode até lembrar um frevo em 3/4. Não penso na rapidez com que posso ou devo tocar, apenas toco o que a música está me pedindo, e tanto nesse caso como em "Cebola no Frevo" os ritmos são rápidos e densos. Isso requer um pouco de técnica e resistência, porém o mais importante é adaptar sua técnica à levada e ao andamento, e não adaptar a música ao que você pode tocar. Se a música é muito rápida e não estou confortável, tiro alguns elementos e tento deixá-la fluir naturalmente.

MD: Em "Samba de Gaúcho", de Chico Pinheiro, aparecem idéias muito interessantes no tema e no solo.
Edu: Trabalho com o Chico há alguns anos e ele me apresentou essa música dizendo que fez em minha homenagem, embora eu não seja gaúcho. Gostei muito dela e resolvi gravá-la nesse CD. Quando ouvi entendi a homenagem, pois ela trata de um assunto de que gosto muito, a ilusão de uma outra unidade de tempo dentro de um 2/4 normal. Ele pegou um trecho e, em vez de agrupar o ritmo harmônico em semínimas, agrupou em colcheias pontuadas, o que dá a sensação de estar tocando em outra pulsação. Então toco uma levada de samba em cima desta outra pulsação, voltando à pulsação em semínimas na segunda parte. Parece que você trocou o andamento, mas é tudo o bom e velho 2/4. Isso pode ser feito com outras figuras e você pode tocar outras levadas em cima de outra pulsação, o que lhe dá recursos infinito para criação. Quanto ao solo, sempre gosto de solar no chorus da música e foi o que fiz. Jamais vou fazer o que toquei nesse solo exatamente igual, pois é a parte improvisada da música e ela depende muito do que os outros músicos estão tocando ou já tocaram nos solos anteriores. Se gravar de novo, o Daniel e o Fabio farão outros solos e eu, com certeza conversarei com eles sobre outros assuntos.

MD: "Cinco" é um samba com cinco tempos - é um jequibau, certo? Como é tocar um samba em cinco de forma que ele ainda suingue?
Edu: Compus essa música, compus pensando em um maracatu em 5/8 com agogô, caixa de maracatu e tudo mais. Eu tinha a melodia pronta, mas sentia que precisava de uns ajustes na harmonia e talvez de uma introdução. Passei-a para o Chico Pinheiro, que apareceu com outras coisas legais que a levaram para um outro lado, onde essa levada com caixa e agogô não funcionava mais, então gravamos assim. Não acho que seja um jequibau e não consigo pensar em um ritmo pronto como maracatu, forró, cocô, etc. Gosto da mistura dos ritmos e todos estão muito próximos, o que nos leva a ter uma infinidade de opções. Penso em uma música como um ritmo só. Os elementos vão surgindo, ela vai tomando novos rumos e de repente já virou outra coisa que não vou saber rotular. Quanto a tocar em 5/8 que ainda suingue, penso que cinco, sete, nove é tudo impar como o três e não sinto dificuldade em tocar em 3/4 ou 6/8, por exemplo. O que falta é intimidade com esses compassos. Não temos essa intimidade porque no repertório popular esses compassos são muito raros, o que faz parecer coisas de outro mundo. Outra coisa que penso é que o cinco, o sete ou o nove tem de ser naturais. Uma vez que a melodia funciona dentro dessas métricas, você vai cantar a música e tocar bateria como se estivesse andando de bicicleta.

MD: Suas conduções fogem da regularidade do samba, chegando a aparecer idéias lineares.
Edu: A bateria é um instrumento no qual você pode tocar uma nota, o que dá uma sensação melódica, ou várias notas ao mesmo tempo, o que vai dar uma sensação harmônica. Não penso em formas lineares ou conceitos específicos. Toco o que a música pede e os contrastes aparecem naturalmente, com uma densidade maior ou menor do instrumento. No momento em que uso poucos elementos com uma densidade baixa ela pode até soar dessa forma "linear". Porem, o que espero é que ela soe como um piano, em que você não separa imediatamente as notas de um acorde. Você ouve o som como um todo, e se depois quiser analisar, pode achar nota por nota que está sendo tocada naquele acorde.

MD: Os solos são compostos com antecedência ou são frutos da improvisação.
Edu: Os solos são sempre frutos de improvisação. Associo os solos a uma conversa entre pessoas dispostas a discutir sobre qualquer tema. Todos os músicos improvisadores têm os seus trejeitos, frases ou gírias, que sempre vão usar. Por isso você reconhece Art Blakey ou Lee Morgan, só para exemplificar, ao ouvir o início de qualquer um de seus solos. Toda conversa tem um assunto, e associo o assunto ao tema que está sendo tocado. Por isso não gosto de improvisar em músicas que não conheço. Se chegar com seu assunto pronto para qualquer conversa, vai ser muito difícil essa conversa fluir. Você não pode ter uma frase de efeito sobre política e querer usá-la em uma conversa sobre futebol. Associo isso a músicos que estudam ou preparam seus solos ou frases e querem tocá-las em qualquer situação. Se a conversa toma outro rumo, eles estarão fora do assunto. O importante é ouvir os outros músicos e conversar sobre esses diversos assuntos usando seus trejeitos e tentando manter uma conversa interessante com personalidade.
Saiba mais sobre Edu Ribeiro visitando o site
http://www.eduribeiro.mus.br

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